Rotina

Ela acordou cedo, sua tia diria que “acordou com as galinhas”, levantou e bebeu um copo d’água, dizem que faz bem beber água assim que acorda, olhou para o relógio: 5h15min, “caraca”, pensou! “Quebrou um recorde, heim?”, diria seu amor com R bem paulistanês como ela costumava usar. Escovou os dentes, tomou banho e bebeu café quente feito na cafeteira elétrica que ganhara da irmã no Natal, depois trocou de roupa e bebeu mais uma xícara de café, depois outra e mais outra.

Ela respirou fundo e prendeu os cabelos num coque simples, passou um batom rosa e espirrou perfume em cima de si. Pegou a pasta e saiu para pegar o metrô, ainda ajustando o relógio de pulso que usava só para dar um ar de sofisticação, já que o relógio na parede da sua sala mediana no escritório era enorme.

Chegou ao trabalho e foi direto para sua mesa: anotou recados, fez ligações, digitou matérias, correu de um lado para o outro, procurou documentos antigos, jogou post-its no lixo e fixou novas no quadro ao lado, atendeu alguns clientes e ligou para o pet shop para saber se sua cadela estava melhor, a sua filha única de pelo estava meio dodói, mas a atendente a tranquilizou, podia buscá-la ao fim da tarde, um alívio, pelo menos. Pausa para o almoço, fila, pega o prato e os talheres, coloca a comida, senta, come, levanta, escova os dentes, volta a sua sala, trabalha, trabalha, trabalha.

“Não dá mais!”, pensou. Cotovelos na mesa, apoia o rosto sobre as mãos e olha para o lado, algo lindo e diferente: um ramalhete de rosas vermelhas, um cartão e uma frase nele que dizia “não faça planos para hoje à noite, seremos só nós dois. Beijos, seu amor... Ops.: antes que eu esqueça, feliz aniversário! Te amo”.

Ela não havia lembrado do próprio aniversário, mas ele sim, ele nunca esquecia, uma noite sem se preocupar com nada, era tudo que precisa para recuperar as energias e amanhã, amanhã era sábado e depois domingo. Dois dias sem planejar nada, vivendo um segundo de cada vez.

Pode, enfim, sorrir, pela primeira vez naquela semana.